publicado em recortes por Marcelo Vinicius
Nobel de Medicina Randy Schekman disse: 'pressão dos cientistas para
publicar nessas revistas de luxo encorajam pesquisadores a perseguir
campos científicos da moda'. A revista científica Nature se defendeu das
críticas do prêmio Nobel Randy Schekman ao assegurar que seleciona os
estudos que publica com base em sua relevância.
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Randy Schekman
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O ganhador do Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 2013, Randy
Schekman, denuncia as revistas científicas pela mercantilização da
ciência. Em artigo publicado no jornal inglês The Guardian, em dezembro
do ano passado, ele afirma que os incentivos oferecidos pelas principais
revistas distorcem a ciência.
Atento à mercantilização da pesquisa, ele diz no artigo que as
decisões editoriais das grandes revistas científicas são guiadas por
interesses comerciais, não apenas científicos, e que a cultura de
supervalorização dessas publicações como estandartes de qualidade é
prejudicial à ciência como um todo.
Também em dezembro de 2013, o ANDES-SN fez denúncia semelhante em reportagem da
Revista Dossiê Nacional Precarização II,
o “Desvio ideológico na concepção do mérito acadêmico” provocado por
esse sistema de produção igualmente conhecido com “mcdonaldização” da
ciência. (
Leia aqui).
Schekman classifica esses periódicos de “revistas de luxo” e um de
seus argumentos principais para denunciá-los é que eles “publicam muitos
trabalhos importantes (outstanding), mas não só trabalhos importantes;
nem são elas as únicas que publicam pesquisas importantes”.
O pesquisador destaca que muitas vezes a escolha do que é publicado
ou rejeitado nessas revistas baseia-se numa avaliação de impacto que não
reflete necessariamente ou unicamente a qualidade e/ou a importância de
um trabalho, mas também a repercussão na mídia e o número de citações
que ele poderá trazer para a revista.
Em outras palavras, as pesquisas não são avaliadas apenas pelo seu
impacto científico, mas também pelo seu potencial impacto midiático e
econômico. Pois são revistas comerciais, que cobram caro pelo seu
conteúdo e precisam vender assinaturas para sobreviver financeiramente.
No artigo, Schekman denuncia exatamente o que os pesquisadores
brasileiros Roberto Leher, da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ); Carlos Saito, da Universidade de Brasília (UnB); e Maria Suely
Leonart, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), revelam na Dossiê
Nacional Precarização II.
Ele diz que é preciso levar em conta que o fator de impacto é uma
nota média, baseada no total de citações recebidas por todos os
trabalhos publicados numa revista ao longo de um determinado período, e
que mesmo o fato de um trabalho ser muito citado não significa,
automaticamente, que ele seja muito importante. “Um trabalho pode ser
muito citado porque é boa ciência, ou porque é chamativo, provocativo ou
incorreto”, escreve Schekman.
“Os editores das revistas de luxo sabem disso, por isso aceitam
trabalhos que vão repercutir porque tratam de assuntos que são ‘sexy’ ou
propõem conclusões desafiadoras. Isso influencia a ciência que os
cientistas produzem; construindo bolhas de ‘pesquisa fashion’ nas quais
os pesquisadores podem fazer propostas ousadas que essas revistas
desejam, e desencorajando a realização de outras pesquisas importantes,
como a replicação de resultados”, diz o pesquisador.
Open access
Como alternativa a esse modelo, Schekman defende a publicação em
revistas de acesso livre na internet (open access journals), sem fins
lucrativos. De 2006 a 2011, ele foi editor-chefe da Proceedings of the
National Academy of Sciences (PNAS), a revista científica da Academia
Nacional de Ciências dos EUA — também uma revista de alto impacto, mas
não tanto como Nature e Science.
Em 2012, ele assumiu o posto de editor-chefe da eLife, uma revista
online de acesso livre criada pelo HHMI, a fundação britânica Wellcome
Trust e a Sociedade Max Planck, da Alemanha. A proposta da eLife é ser
uma revista “para cientistas, editada por cientistas”, livre de
interesses comerciais (para mais informações, assista ao vídeo clique
aqui:
http://www.youtube.com/watch?v=oR5ox0Pzd3s)
Para entender a lógica dos argumentos de Schekman basta pensar na
seguinte situação: Se, por um lado, um pesquisador brasileiro A publicar
um trabalho na eLife, ele (supostamente) terá sido revisado por alguns
dos melhores cientistas da área e terá sido avaliado com base em
critérios de qualidade puramente científicos; mas, aos olhos da sua
instituição, da Capes e das agências de fomento brasileiras, será uma
publicação de pouca importância porque o fator de impacto da eLife é
baixo.
Por outro lado, um pesquisador brasileiro B que publicar um trabalho
qualquer na Nature, Science, Cell ou outra revista de alto impacto será
automaticamente visto como um grande cientista, não importa a qualidade
ou a importância da sua pesquisa em questão (que pode ser maior, menor
ou igual à da pesquisa publicada na eLife).
“Isso significa que o pesquisador B é melhor do que o A? Talvez sim,
talvez não. Só mesmo uma análise individual, caso a caso, pode
determinar isso com precisão. O grande problema é: Quem tem tempo para
uma análise dessas?”, indaga.
A edição de 2013 do Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia,
distribuído pelo Instituto Karolinska, uma universidade da Suécia,
concedeu aos vencedores 8 milhões de coroas suecas (US$ 1,3 milhão).
Bioquímico e pesquisador do Instituto de Medicina Howard Hughes (HHMI),
da Universidade da Califórnia, em Berkeley, Schekman ganhou o prêmio
juntamente com os cientistas norte-americano James Rothman e alemão
Thomas Südhof pela descoberta dos mecanismos essenciais que executam e
controlam o transporte de moléculas no interior das células. As
descobertas do trio ajudaram a compreender melhor doenças como tétano e
diabetes.
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Randy Schekman |
Slow Science
Em contraposição à fast Science, em 2010, surgiu na Alemanha o
manifesto “slow science”, o qual ganhou projeção e adesão de boa parte
do mundo científico no planeta e agora conta até com uma petição online,
lançada na França. Os cientistas signatários da slow science entendem
que o mundo da ciência sofre de uma doença grave, vítima da ideologia da
competição selvagem e da produtividade a todo preço.
A praga cruza os campos científicos e as fronteiras nacionais. O
resultado é o distanciamento crescente dos valores fundamentais da
ciência: o rigor, a honestidade, a humildade diante do conhecimento, a
busca paciente da verdade. A “mcdonaldização” da ciência produz cada vez
mais artigos científicos, atingindo volumes muito além da capacidade de
leitura e assimilação dos mais dedicados especialistas. Muitos
trabalhos são publicados, engrossam as estatísticas oficiais e os
currículos de seus autores, porém poucos são lidos e raros são, de fato,
utilizados na construção da ciência.
Os defensores da slow science acreditam que é possível resistir à
fast science. Defendem a possibilidade de reservar ao menos metade de
seu tempo à atividade de pesquisa; pretendem se livrarem, vez por outra,
das demandantes atividades de ensino e das atividades administrativas;
querem privilegiar a qualidade e não a quantidade de publicações; e
pleiteiam preservar algum tempo para os amigos, a família, o lazer e o
ócio.
Em 2011, o movimento foi divulgado na rede social Facebook e, com
isso, o Manifesto do grupo ganhou notoriedade. “Somos a favor da ciência
acelerada do início do século XXI. Somos a favor do fluxo interminável
de revistas com pareceristas anônimos e seu fator de impacto; gostamos
de blogs de ciência e mídia, e entendemos as necessidades que relações
públicas impõem. Somos a favor da crescente especialização e
diversificação em todas as disciplinas. Queremos pesquisas que tragam
saúde e prosperidade no futuro. Estamos todos neste barco juntos”, diz o
documento.
No Manifesto, os mais de mil adeptos da Slow Science acredita que
isto não basta. Eles pensam que a “ciência precisa de tempo para pensar,
de tempo para ler e tempo para fracassar”. Afirmam que “a ciência nem
sempre sabe onde ela se encontra neste exato momento, que a ciência se
desenvolve de forma instável, por meio de movimentos bruscos e saltos
imprevisíveis à frente e que, ao mesmo tempo, contudo, ela muitas vezes
emerge lentamente, e para isso é preciso que haja estímulo e
reconhecimento”.
No Manifesto, o Movimento Slow Science informa que “durante séculos, a
slow science foi praticamentea única ciência concebível” e que, para
eles, ela merece ser recuperada e protegida, que a sociedade deve dar
aos cientistas o tempo de que eles necessitam, e os cientistas precisam
ter calma.
“Sim, nós precisamos de tempo para pensar. Sim, nós precisamos de
tempo para digerir. Sim, nós precisamos de tempo para nos desentender,
sobretudo quando fomentamos o diálogo perdido entre as humanidades e as
ciências naturais. Não, nem sempre conseguimos explicar a vocês o que é a
nossa ciência, para o que ela servirá, simplesmente porque nós não
sabemos ainda. A ciência precisa de tempo: – Tenham paciência conosco,
enquanto pensamos”.
Nature se defende das críticas do Nobel Randy Schekman
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Nature
se defendeu das críticas do prêmio Nobel de Medicina Randy Schekman ao
assegurar que seleciona os estudos que publica com base em sua
relevância. |
Londres - A revista britânica "Nature" se defendeu das críticas do
prêmio Nobel de Medicina Randy Schekman ao assegurar que seleciona os
estudos que publica "com base em sua relevância científica" e não em seu
impacto.
O biólogo celular declarou um boicote a essa revista e às americanas
"Cell" e "Science", às quais não voltará a enviar mais pesquisas de seu
laboratório, por considerar que distorcem o processo científico e
representam uma "tirania".
O americano, ganhador do prêmio Nobel de Medicina em 2013, considera
que a pressão dos cientistas para publicar nessas revistas "de luxo"
encorajam os pesquisadores a perseguir campos científicos "da moda" em
vez de realizar trabalhos de mais relevância.
Em artigo publicado esta semana em "The Guardian", Schekman afirma
que o problema se exacerba pelo fato de que os diretores dessas
publicações não são cientistas, mas profissionais que buscam a
publicação de estudos com mais impacto.
"Publiquei com os grandes nomes, incluindo publicações que me valeram
para ganhar um prêmio Nobel. Mas já não mais", disse ao periódico,
acrescentando que: "Da mesma forma que Wall Street tem que se desligar
da cultura das gratificações, a ciência deve romper com a tirania das
publicações famosas".
Em resposta a Schekman, o diretor da "Nature", Philip Campbell, disse
que sua revista trabalha com a comunidade científica há mais de 140
anos e que o apoio recebido por parte dos autores de pesquisas e
críticos valida seu trabalho.
"Selecionamos as pesquisas que vão ser publicadas na 'Nature' com
base em sua importância científica", afirmou Campbell em comunicado
enviado hoje à Agencia Efe.
"A comunidade científica tende a uma 'superdependência' ao avaliar as
pesquisas pela publicação na qual aparecem ou pelo 'fator impacto'
dessa revista", reconheceu.
Campbell lembrou que, em uma pesquisa realizada este ano pelo Grupo
Editorial Nature entre mais de 20 mil cientistas, os três fatores mais
importantes na hora de escolher uma publicação para divulgar um estudo
foram: "A reputação da revista, a relevância do conteúdo da revista em
sua disciplina e o fator impacto dessa publicação".
"Meus colegas e eu expressamos preocupação com a 'superdependência'
nos fatores de impacto muitas vezes ao longo dos anos, tanto nas páginas
da 'Nature' como na de outras revistas", disse.
Fontes:
Agência EFE | LONDRES
ANDES-SN